O risco da perda de Neutro

Nesta semana recebi um chamado para verificar a instalação de um cliente que reclamava de constante queima de lâmpadas em sua instalação; um prédio comercial recém adquirido, ainda sucateado por falta de uso, que iria passar por reforma assim que seu novo proprietário tivesse condições. Perguntei a ele se não estava fazendo uso de lâmpadas incandescentes que sabemos ter baixa vida útil, mas ele retrucou que estavam sendo utilizadas lâmpadas fluorescentes eletrônicas... Rapidamente , como um flash, me vem a mente a palavra NEUTRO! Quando chego ao local, cerca de uma hora depois, num cumprimento de profecia, estava lá, o borne de neutro do padrão de medição da concessionária "torrado". Bem, neste caso, o prejuízo do meu cliente não chegou a R$ 50, pois mal estava em uso o prédio, mas as consequências poderiam em outras situações serem bem desastrosas...

Vamos lá: o que acontece quando perdemos o neutro de uma instalação elétrica??? Vamos entender primeiro o que é um sistema elétrico trifásico.

Sistema RST (Rede Simétrica Trifásica)

Essa "sopinha de letras" coloridas foi bem de propósito para destacar que um sistema trifásico é composto por três fases idênticas mas intercaladas em 120°

Existem duas configurações deste sistema: o triangulo (chamado também de delta) e o estrela (as vezes chamado Y).No nosso caso, nos deteremos ao estrela,

pois é o mais comum.

Na ligação estrela, o ponto central, que chamamos de neutro, funciona como ponto de equilíbrio do sistema. Quem se lembra da 1ª lei de Kirchoff???

"Em qualquer nó, a soma das correntes que o deixam(aquelas cujas apontam para fora do nó) é igual a soma das correntes que chegam até ele."

 

Vamos supor então que as cargas Z1, Z2 e Z3 sejam iguais e que VL sejam tensões de linha de mesmo valor porém distintas, de fontes diferentes; teremos então que a corrente que chega em 1 , passa por Z1, e se divide, indo para Z2 e Z3, ficando da seguinte forma:

IL1 = IL1(2) + IL1(3), sendo IL1 a corrente que chega no nó 0, e IL1(2) e IL1(3) as correntes que saem do nó 0

Do mesmo modo, temos a corrente que chega em 2 , passa por Z2 e se divide, indo para Z1 e Z3, ocorrendo no ponto 3, de modo similar, ou seja, entra em 3, passa por Z3, se divide para Z1 e Z2.

Ficamos assim então:

I

L1 = IL1(2) + IL1(3)

IL2 = IL2(1) + IL2(3)

IL3 = IL3(1) + IL3(2) 

Aplicando a lei de Kirchoff, temos:

IL1+IL2+IL3 = (IL1(2)+IL1(3))+(IL2(1)+IL2(3))+(IL3(1)+IL3(2)

Considerando que Z1,Z2 e Z3 são iguais, e que os valores de tensão também são, teremos que IL1, IL2 e IL3 são iguais, e suas divisões pela malha também (IL1(2) igual a IL1(3)), podemos escrever que

3(IL) = 3(IL1 + IL2)

3(IL) - 3(IL1 + IL2) = 0,

que é nossa corrente de neutro, ou a corrente que sai do nó 0.

Bem, todo este aparato matemático nos diz que, se interrompermos a ligação do neutro que vem da nossa fonte, nada acontecerá. Só que na prática nos nunca temos um circuito trifásico perfeitamente equilibrado, principalmente em redes de distribuição de energia...

O que ocorrerá então?!?!?!?!?!

Como as impedâncias são diferentes entre si, as correntes que circulam entre as fases, serão diferentes entre si, também, e haverá corrente maior que zero percorrendo o condutor neutro. Havendo rompimento do condutor neutro por qualquer hipótese, ficaria como no exemplo abaixo:

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 Onde o circuito passa a se comportar como um circuito série, e a corrente elétrica que o percorre será sempre referente a divisão em a tensão entre fases (230V) e o somatório das impedâncias(447,9 ohms). Com isto, a tensão que entre as cargas sempre era de 127V (tensão entre fase e neutro) passa a ser dada em função da impedância de cada carga. Equipamentos de menor consumo elétrico, como eletrônicos, recebem neste momento uma sobretensão desastrosamente alta para ele, danificando-os, como no caso das lâmpadas do meu cliente.

Certa vez em presenciei um caso em que estava sendo feita a manutenção de um sistema de rede estabilizada, onde se tinha um estabilizador trifásico de 22KVA, alimentando 9 andares de um prédio pertencente a um órgão público estadual. Pois bem, foi desligada a rede para manutenção, retirado o equipamento danificado, e instalado o equipamento novo. Já chegando no final do prazo da janela de manutenção (tempo de paralisação do sistema destinado a sua manutenção), a equipe começou a acelerar o serviço, e fatalmente "esqueceram" de ligar o condutor neutro do equipamento ao neutro do sistema de distribuição.

Resultado: cada andar tinha pelo menos duas Multifuncionais laser Xerox 3600, na época custando cerca de R$ 4000 cada. De 25 maquinas no prédio, 

10 maquinas destas foram danificadas quando se re-energizou a alimentação estabilizada do prédio. A garantia da assistência técnica não cobriu, e todo o reparo foi custeado pela instituição. Quanto a equipe... prefiro nem comentar, mas sei que situações como estas podem acontecer, e podem ser bem danosas.

Dúvidas?!?!?! Lembre-se:

Sua dúvida é meu aprendizado!!!!